Justiça mantém prisão de mulher suspeita de levar idoso morto a banco
A Justiça
manteve na quinta-feira a prisão de Érika de Souza Vieira Nunes, de 43 anos,
que na terça-feira, 16, conduziu a uma agência bancária, em uma cadeira de
rodas, Paulo Roberto Braga, de 68 anos, cuja morte foi confirmada dentro do
banco.
Érika foi
presa em flagrante por dois crimes: furto mediante fraude e vilipêndio a
cadáver. Com a decisão, ela permanecerá presa aguardando julgamento.
A audiência
de custódia, a que todo preso é submetido para que um juiz avalie se houve
alguma irregularidade na prisão, ocorreu na tarde desta quinta-feira na cadeia
José Frederico Marques, em Benfica, na zona norte do Rio.
Érika estava
acompanhada por sua advogada, Ana Carla de Souza Corrêa, que pediu à Justiça a
liberdade provisória de sua cliente e, se esse pedido não fosse atendido, que
Érika pudesse passar a cumprir prisão domiciliar, para poder cuidar da filha de
14 anos que é portadora de deficiência, sem diagnóstico conclusivo. Já o
Ministério Público (MP-RJ) pediu ao juízo que a prisão em flagrante fosse
convertida em preventiva.
Ao juízo foi
dito que Érika tem quatro filhos, de 28, 27, 17 e 14 anos, e morava com eles e
o tio, agora morto. Para levar o tio ao banco, ela deixou a filha deficiente,
Beatriz, aos cuidados do irmão de 27 anos.
A juíza
Rachel Assad da Cunha atendeu o MP-RJ e afirmou que, pelo que se percebe nos
vídeos, quem queria fazer o empréstimo era Érika, embora o dinheiro não
pertencesse a ela. Registrou ainda que a presa parecia mais preocupada com o
empréstimo do que com a saúde do tio e que a possibilidade de ter levado o tio
já morto ao banco "torna a ação mais repugnante e macabra".
"O
ponto central dos fatos não se resume em buscar o momento exato da morte,
informação que sequer o exame de necropsia conseguiu apontar. A questão é
definir se o idoso, naquelas condições, mesmo que vivo estivesse, poderia
expressar a sua vontade. Se já estava morto, por óbvio, não seria possível. Mas
ainda que vivo estivesse, era notório que não tinha condições de expressar
vontade alguma, estando em total estado de incapacidade."
A juíza
continua: "Portanto, ainda que se alegue não ter a custodiada percebido a
sua morte e não ser possível estabelecer o momento exato em que ela teria
ocorrido, certo é que o idoso não respondia a qualquer estímulo, o que pode ser
notado nos vídeos.
Assim, não
era possível ao Sr. Paulo, seja pelo motivo que fosse, assentir com o
empréstimo, tudo a indicar que a vontade ali manifestada era exclusiva da
custodiada, voltada a obter dinheiro que não lhe pertencia, mantendo, portanto,
a ilicitude da conduta, ainda que o idoso estivesse vivo em parte do
tempo"
A magistrada
registra que o laudo de necropsia, feito pelo Instituto Médico Legal do Rio,
não determina a hora exata em que o idoso morreu, "mas também não afasta a
possibilidade de que o idoso já estivesse morto ao ingressar na agência,
descrevendo informação do Samu de que o idoso já estava morto há algum
tempo". "A possibilidade de já ter sido levado morto torna a ação
mais repugnante e macabra."
"Assim,
ainda que a custodiada não tenha notado o exato momento do óbito, era
perceptível a qualquer pessoa que aquele idoso na cadeira de rodas não estava
bem. Diversas pessoas que cruzaram com a custodiada e o Sr. Paulo ficaram
perplexos com a cena, mas a custodiada teria sido a única pessoa a não
perceber? O que salta aos olhos e incrementa a gravidade da ação é que em
momento algum a custodiada se preocupa com o estado de saúde de quem afirmava
ser cuidadora. Os funcionários do banco é que, notando aquela cena vexatória e
cruel, acionaram o socorro."
Segundo a
juíza, "o ânimo da indiciada se voltava exclusivamente a sacar o dinheiro,
chegando ao ponto de fazer o sr. Paulo segurar uma caneta para demonstrar que
estaria assinando o documento".
A juíza
afirma ainda que, segundo foi informada, o idoso havia recebido alta de
internação por pneumonia na véspera de ser levado ao banco. "Caberá à
instrução probatória verificar, ainda, se a própria conduta (de levá-lo ao
banco) não teria contribuído ou acelerado o evento morte, por submeter o idoso
a tanto esforço físico, em momento que evidentemente necessitava de repouso e
cuidados", escreveu.
"A
primariedade, por si só, não confere o direito à liberdade, ainda que
comprovados residência fixa e atividade laborativa lícita", continuou a
magistrada.
"Indefiro
a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar, já que o fato de a
custodiada possuir filha com deficiência não pode servir como salvo conduto
para a prática de crimes.
Acrescente-se
que a custodiada se desobrigou dos cuidados com a filha para praticar a conduta
criminosa, uma vez que deixou a adolescente aos cuidados do irmão mais
velho", concluiu Rachel.
A reportagem
tentou ouvir a advogada de Érika sobre a decisão que converteu em preventiva a
prisão em flagrante de sua cliente, mas não obteve contato até a publicação
desta matéria. Em oportunidades anteriores, a defesa havia destacado que idoso
estaria vivo ao chegar à agência bancária.